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Por que a criança não aprende?


O Neuropediatra por ser um especialista na área de desenvolvimento neuropsicomotor tornou-se um profissional freqüentemente requisitado a reconhecer crianças com alterações em áreas do desenvolvimento como comportamento e aprendizagem. Geralmente, estes encaminhamentos associam-se a dúvidas dos pais ou professores sobre a origem do problema;
se há relação com o desenvolvimento e por esta característica tem caráter transitório, se decorre de fatores emocionais ou motivacionais ou se associam a um quadro orgânico que compromete funções cerebrais importantes para as relações acadêmicas e sociais da criança. A resposta a estas dúvidas nem sempre é uma tarefa fácil. O médico deve lembrar que a aprendizagem e o comportamento são processos dinâmicos e ativos sujeito à interferência de vários fatores relacionados ao estímulo ambiental (possibilidades reais que o meio oferece em termos de quantidade, qualidade e freqüência de estímulos) e a neurobiologia da própria criança (inteligência global, integridade motora e sensório-perceptual, domínio da linguagem e capacidade de simbolização); nem sempre a causa primária de um “déficit” ou “dificuldade” está na criança; o ambiente familiar estimulador, as expectativas sociais, a motivação do professor para ensinar e a metodologia de ensino da escola podem representar pólos importantes para a origem do problema. Também deve ter uma boa compreensão sobre os marcos normais de desenvolvimento e saber que funções cerebrais como coordenação, percepção, atenção e memória sofrem profundas transformações evolutivas à medida que a criança cresce, assim, toda interpretação de um Déficit de aprendizagem ou problema comportamental deve ser baseada na prontidão neurológica que a criança possui nas distintas faixas etárias.
Transtornos de Aprendizagem Escolar – Definições
O termo Transtorno de Aprendizagem Escolar ( TAE)
é amplo porque engloba todas os fatores ambientais, emocionais, orgânicos e neurobiológicos que interferem com a aprendizagem; é apenas um sintoma decorrente de várias situações médicas e não médicas.
Sobre um enfoque neurobiológico o termo Transtorno Especifico de Aprendizagem Escolar (TEA) é o mais adequado para definir crianças normais do ponto de vista emocional, cognitivo e orgânico, com educação apropriada, mas que apresentam funcionamento acadêmico abaixo do esperado para idade cronológica e inteligência.
É recomendável aos profissionais o uso de uma linguagem sistematizada, nesse sentido o DSM-IV - Manual Diagnóstico E Estatístico De Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria é o livro consagrado para emissão de diagnósticos que envolvam sintomas cognitivo-comportamentais. Em seu primeiro capítulo o manual aborda os Transtornos geralmente diagnosticados pela primeira vez na infância ou adolescência, todos eles podem gerar ou associar-se ao Transtorno de Aprendizagem Escolar, porém há um item específico que engloba os Transtornos Específicos de Aprendizagem Escolar (TEA).
O DSM-IV define TEA como um funcionamento acadêmico substancialmente abaixo do esperado (dois desvios padrões entre rendimento e QI) para idade cronológica e inteligência no contexto de uma educação apropriada sendo o diagnóstico baseado em testes padronizados e individualmente administrado de leitura, matemática e escrita. O termo TEA aplica-se somente aos indivíduos que apresentam inteligência normal
e que não tenham um outro fator causador de suas dificuldades de aprendizagem como, por exemplo: escolarização precoce, faltas escolares, ensino deficiente, desmotivação, falta de familiaridade com a língua de instrução, déficit visual e auditivo, deficiência mental, incapacidade física, doenças neuropsiquiátricas, uso crônico de medicamentos.

Transtornos de Aprendizagem Escolar – Causas relacionadas ao estímulo ambiental
A. Falta de Estímulo: A criança deve aprender determinados conceitos na fase pré-escolar que posteriormente lhe facilitarão o aprendizado da leitura e escrita. São funções como orientação espacial, orientação temporal, ritmo; habilidades visuais (discriminação de diferenças e semelhanças, percepção de forma e tamanho, figura e fundo, memória, seguimento ocular), habilidades auditivas (discriminação de sons, figura e fundo, percepção, memória), coordenação viso-motora, linguagem oral (pronuncia, vocabulário e sintaxe) e linguagem simbólica (capacidade de simbolização). Todas essas habilidades não são adquiridas de forma passiva, necessitam de treinamento específico.
B. Metodologia de ensino: A habilidade da leitura aprende-se em 3 estágios distintos:
• Estágio Visual (4 - 6 anos): análise visual do estimulo gráfico. A criança aprende a reconhecer a letra e copiá-la.
• Estágio fonológico (5 - 7 anos): reconhecimento e processamento dos sons associados aos símbolos gráficos. A criança aprende a reconhecer os diferentes sons das letras e discerni-los quando integrados na palavra, lê de forma lenta e silabada com pouco conteúdo interpretativo.
• Estágio ortográfico (6 - 9 anos): Memorização e reconhecimento da palavra inteira.
A criança aprende a ler de forma fluída e com bom nível de compreensão.
O método de ensinar pode ser diferente para cada escola, algumas priorizam o método global com ênfase no estágio ortográfico, outras priorizam o método fonético com ênfase no estágio fonológico, porém, para algumas crianças a escolha do método deve ser individualizado em função das dificuldades que a mesma possui. È freqüente a observação na prática clínica de crianças que apresentavam dificuldades em uma determinada escola que ao se transferirem para outra escola com método diferente da anterior, passaram a não ter mais dificuldades.
C. Aspectos psicológicos, familiares e culturais: Muitas vezes é difícil diferenciar se estes fatores são causas ou conseqüências de TAE. As crianças com TAE geralmente são pressionadas pela família, professores e não conseguem corresponder as estas expectativas, tem sua auto-estima rebaixada e passam a apresentar sintomas depressivos, fatos que acentuam sua desmotivação para os estudos.
A desorganização familiar no sentido de não orientar uma adequada rotina para a criança além de gerar estresse infantil também é um fator causal de TAE. São exemplos: os excessos de atividades extra-escolares, a falta de horários para estudos, a falta de supervisão dos pais.
O aspecto cultural é representado pela tradição familiar em relação às necessidades e perspectivas relacionadas aos estudos. Em algumas famílias o padrão de exigência é tão elevado em relação ao aproveitamento escolar a ponto de exigirem que as crianças sejam alfabetizadas em idades nas quais elas ainda não possuem prontidão neurológica para essa função, outras não vêem nos estudos algo fundamental para a vida da criança. Ambas as abordagens são inadequadas e geradoras de problemas escolares e comportamentais.

Transtorno de Aprendizagem Escolar – Causas médicas gerais
• Uso de medicamentos ou drogas cujos efeitos colaterais possam interferir em funções como atenção, memória e ritmo de sono, exs: Antiepilépticos, Antihistamínicos, Álcool, Maconha, Cocaína, Cola de sapateiro.
• Déficits sensoriais: Hipoacusia, Déficits refracionais.
• Doenças crônicas como Anemia, Verminose, Cardiopatias, Nefropatias, Epilepsias, Enxaquecas, Moléstia reumática sob a forma de Coréia de Sidehan, etc; causam TAE tanto pelo aspecto incapacitante como pelo alto índice de faltas e evasão escolar.
• Encefalopatias crônicas: Deficiência Mental, Paralisia cerebral.
Ao chegarem na fase pré-puberal ou puberal passam a desenvolver-se em um ritmo normal.
Geralmente o quadro é relacionado com uma lentidão da mielinização e sinaptogênese cerebral e parece haver influências hormonais pelo fato de serem mais freqüentes no sexo masculino. Muitas vezes pode ser confundido com Dislexia, porém na criança disléxica as dificuldades de aquisição da leitura são persistentes mesmo após a fase pré-puberal (Nove anos).
Transtorno de Aprendizagem Escolar – Causas Neurobiológicas
Nos TEA, é improvável que um único fator possa ser responsável, ao contrário parece que uma série de fatores precisa agir em conjunto – causas multifatoriais. Fatores genéticos estão implicados pelas altas incidências em parentes próximos dos indivíduos afetados e também pela participação do cromossomo X, uma vez que, o quadro predomina no sexo masculino na proporção de 3:1. Fatores ambientais relacionados ao período gestacional e neonatal têm alguma influência, pela alta freqüência nos históricos das crianças de tabagismo e alcoolismo materno e de intercorrências de parto como prematuridade, baixo peso, tocotraumatismo e hipóxia cerebral. Todos esses fatores isolados ou associados podem comprometer os circuitos cerebrais gerando micro lesões como alteração do neurônio ou sinapse que evolutivamente causarão déficits funcionais em áreas relacionadas à linguagem, atenção e memória. A seguir serão abordadas as principais causas de Transtorno de Aprendizagem Escolar relacionadas a doenças neurobiológicas.
1. Distúrbios da Linguagem
Disfasia: Caracteriza-se por dificuldades na aquisiçã o da linguagem verbal.
Pode ser de compreensão (lesão da área temporal Wernicke) ou expressão (lesão da área frontal de Broca). As crianças comprometidas geralmente apresentam dificuldades de elaborar palavras ou formar frases. Em um quadro mais grave que evolutivamente pode associar-se a TAE, problemas comportamentais e de sociabilização.
Dislexia: Caracteriza-se por dificuldades persistentes de aquisição da linguagem simbólica (leitura). O quadro pode variar desde uma incapacidade total de aprender a ler até uma leitura próximo do normal, silabada, com alguns erros de pronúncia e erros ortográficos na escrita. É um distúrbio relativamente freqüente com incidência entre 7 a 10% na população escolar.
A palavra Dislexia possui a seguinte origem semântica:
DIS: Distúrbio LEXIA: Linguagem (Grego) Leitura (Latim).
DISLEXIA – Distúrbio da Linguagem e da Leitura.
Já em seu sentido semântico percebe-se que a Dislexia está intrinsecamente relacionad a a um problema de linguagem, particularmente linguagem no sentido de c omunicação. O d isléxico apresenta dificuldades no nível mais primitivo da linguagem o fonológico, o que lhe dificulta progredir para a forma mais complexa a da compreensão simbólica – leitura. Ele a presenta dificuldades de leitura porque interpreta mal as características sonoras dos símbolos gráficos (fonemas), reconhece com dificuldade esses sons quando estão integrados na palavra falada, tem dificuldade de compô-los em uma seqüência lógica para formar e reconhecer palavras novas.
O diagnóstico é baseado em uma história clínica com as seguintes características Crianças normais do ponto de vista cognitivo e emocional, com pelo menos dois anos de escolaridade, submetidos a um adequado estímulo ambiental e escolar, mas que persistem com dificuldades de aquisição da leitura, principalmente após os nove anos de idade. Geralmente apresentam antecedentes de a traso de aquisição ou Transtornos da Linguagem e história familiar de distúrbios da linguagem ou Dislexia.
Bases Genéticas: Estudos clínicos e epidemiológicos sugerem uma base genética para a origem da Dislexi a Nos diversos estudos com indivíduos disléxicos identificou-se história familiar em parentes de primeiro grau em 25 a 65% dos casos. Os estudos na área de Genética m olecular tem identificado anormalidades cromossômicas evidentes nos cromossomos 6 e 15. O projeto Genoma h umano já identificou os Genes DYX1, DYX2, DYX3, DYX4, relacionados a subtipos específicos de d islexias.
Bases Patológicas: As alterações gênicas previamente descritas condicionam a formação de um cérebro com alterações estruturais nos circuitos relacionados à linguagem. Essas alterações podem ter um caráter variado Por exemplo, enquanto o c órtex cerebral das áreas interpretativas tem seis camadas de células sendo a primeira camada desprovida de células nas pessoas normais, nos Disléxicos existem as mesmas seis camadas, porém a primeira camada é provida de células, ou seja, n os Disléxicos , essas células estão em um local que não deveriam estar ( e ctopias). Elas chegam a esse local porque erram o caminho durante o período de formação cerebral durante o estágio de migração neuronal entre o primeiro e segundo mês de gesta ção . Além de incorretamente localizadas essas células geralmente estabelecem conexões inadequadas com outras células ( m icrodisgenesias). Essas alterações também ocorrem na camada de neurônios magnocelulares do t álamo. A organização defeituosa desses circuitos gera um déficit de função cerebral na área do tálamo relacionado ao processamento de informações rápidas (p. ex. visão durante a leitura, percepção de sons durante a conversação) e também dificuldades interpretativas por comprometimento do córtex cerebral – áreas interpretativas ( g iro angular, área de Wernicke).
Dislexia e Processamento Fonológico: As pessoas normais podem discernir as mais rápidas combinações de sons encontradas em uma palavra como, por exemplo, o som do “P” e do “A” na palavra “PA” que estão separadas por um tempo aproximado de 10 milésimos de segundos.
Os disléxicos com desordem do processamento fonológico (90% dos casos) necessitam de um tempo maior, aproximadamente 80 milésimos de segundo Isto lhes acarret a um grave problema de leitura uma vez que esta é aprendida pela combinação dos símbolos (letras) com os seus respectivos sons (fonema s ). As dificuldades em superar o estágio fonológico da leitura também dificultam o progresso ao estágio ortográfico. É importante ressaltar que mesmo diante de todas estas dificuldades, os disléxicos geralmente mantêm a capacidade de processar a leitura ,embora esta seja de aquisição lenta Quando ela ocorre, o erro ortográfico continua com uma certa freqüência.

Dislexia e Processamento Visual: Apesar do processamento visual não ser um fator preponderante na causa da Dislexia algumas anormalidades dessa função podem interferir com a habilidade da leitura. Um número menos freqüentes de disléxicos (aproximadamente 10%) apresent a problemas de leitura porque têm dificuldade de manter a imagem da palavra em seu campo visual. Ao praticar o ato da leitura, “varrendo” a página da esquerda para direita as letras parecem tremular, as palavras parecem mexer, às vezes desaparecem do campo visual, tornando difícil o seu processamento. Os estudos histopatológicos do D r . Al Galburda da Escola de Medicina de Harvard demonstraram que esses indivíduos também apresentam um menor número de neurônios nas camadas magnocelulares do t álamo esquerdo. Alguns estudos têm demonstrado que esses pacientes podem beneficiar-se do uso de lentes oculares especiais (Lentes de Irlen).
Dislexia e Aspectos Sociais: Embora tenham inteligência, capacidade visual e auditiva normais, os disléxicos podem apresentar problemas de interação social por suas dificuldades de processamento rápido relacionadas à visão e à audição. Sua percepção pode ser distorcida como, por exemplo, entender mal uma conversação, assimilar mal pistas não verbais (linguagem corporal, expressão facial, tom de voz), ocasionando situações constrangedoras, mal-entendidos, rejeição e isolamento.
Dislexia e Plasticidade Cerebral: Estudos com Ressonância M agnética F uncional E ncefálica ,conduzida por Shoywitz, da Universidade de Yale, têm demonstrado que os d isléxicos tendem a usar outras regiões do cérebro como a área motora de Broca para compensar os déficits nas regiões relacionadas à compreensão (área de Wernicke). Quando os d isléxicos lêem ocorre um aumento da atividade na área frontal esquerda (Broca) e uma diminuição da atividade na porção anterior (área de Wernicke), o contrário do que ocorrem nos controles normais.
Dislexia – Tratamento: Não há um tratamento medicamentoso específico. Medicamentos podem ser indicados apenas para fatores associados como Transtorno de Atenção e problemas comportamentais. Não há tampouco uma terapia cognitiva única. O tratamento deve basear-se em medidas que favoreçam a plasticidade cerebral, caminhos cerebrais alternativos para o processamento da leitura. Algumas crianças aprendem a ler mais facilmente amparada pela fonética, outras aprendem melhor através de técnicas lingüísticas em que as formas visuais complexas das palavras são aprendidas em contexto. Crianças com dificuldades no estágio ortográfico beneficiam-se melhor das técnicas lingüísticas porque são instruí das a reconhecer a palavra inteira.
Crianças com d ificuldades no estágio fonológico devem ser treinadas por técnicas fonéticas. Existem programas de computador com exercícios baseados no treinamento do cérebro para reconhecer mudanças rápidas de fonemas na fala normal Um exemplo é o FAST FORWAR D , programa já usado em escala comercial no s EUA. Também existem jogos infantis programados para diminuir o ritmo da fala e prolongar a duração dos sons tornando mais fácil a compreensão dos fonemas. A terapia fonoaudiológica em cabine também é um importante recurso para reabilitação de d isléxico com alteração do Processamento Auditivo.

2. Distúrbio da Atenção
Entidade antigamente conhecida por Disfunção Cerebral Mínima o Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDA/H) é uma patologia com grande prevalência na idade escolar.
Caracteriza-se por graus inapropriados de atenção, impulsividade, hiperatividade, coordenação motora e linguagem; todas essas séries de transtornos podem apresentar-se isoladamente ou em diferentes combinações. Em geral o comportamento inadequado dessas crianças associadas às dificuldades de abordagem por parte dos familiares e professores geram problemas graves de ordem acadêmica e psicossocial. É classificado em 3 sub-tipos: A. predominante Desatento com prejuízos maiores sobre as funções acadêmicas, B. predominante Hiperativo-Impulsivo com prejuízos maiores sobre as funçõ es comportamentais, C.
Combinado: associação de desatenção, hiperatividade e impulsividade.

O TDA/H é o protótipo de doença neurobiológica na qual seus sintomas em determinados períodos do desenvolvimento infantil podem confundir-se com características comportamentais observadas em crianças normais ou mesmo associar-se a outras doenças sistêmicas. Como não existe um teste fidedigno ou marcador laboratorial específico para o seu diagnóstico e também pelo fato de a doença causar um comprometimento generalizado do processamento de informações pelo Sistema Nervoso Central, é necessário que as crianças sejam submetidas a uma investigação minuciosa de funções cerebrais como comportamento, atenção, percepção, linguagem, coordenação e memória. Estas avaliações devem integrar a opinião de profissionais das diversas áreas multidisciplinares. Ao longo do processo, são analisados as informações colhidas dos familiares e professores, aplicados os critérios operacionais do DSM-IV e finalmente realizados testes específicos para identificação das funções cerebrais comprometidas. Estes procedimentos resolvem as dificuldades de interpretar os sintomas na maioria dos casos; auxiliam o médico a não emitir um parecer baseado em informações de uma única fonte ou não definir um perfil de comportamento mediante observações de uma única consulta. Uma situação muito comum em consultório, que muitas vezes pode gerar diagnósticos equivocados, é o relato dos sintomas clássicos do TDAH pelos pais e professores, porém, durante a consulta médica os mesmos não são visualizados. Isto ocorre porque as crianças são capazes de controlar os sintomas com esforço voluntário em atividades que envolvem grande esforço ou interesse.
O diagnóstico pode oferecer dificuldades quando se refere a Lactentes e Pré-escolares; os critérios operacionais do DSM-IV não são confiáveis para crianças menores de 4a6m e até certo ponto níveis inadequados de atenção, hipercinesia e impulsividade podem ser comportamentos normais nestas idades. Somente o acompanhamento do desenvolvimento da criança com monitorização de atividades que envolvem sua atenção e comportamento oferecerão ao médico a possibilidade de um diagnóstico inequívoco. Este fato associado à falta de informações seguras sobre os riscos para a saúde do uso de medicamentos psicoestimulantes desaconselham a terapia medicamentosa para crianças com suspeita de TDAH em idades precoces.
Nestes casos a melhor conduta é orientar os familiares sobre posturas educacionais preventivas e dependendo da situação optar pela realização de terapia comportamental cognitiva. As intervenções educativas direcionadas a pré-escolares são mais efetivas porque as condutas disruptivas estão menos estabelecidas e o controle do comportamento é mais bem assimilado nestas idades.
Existe um amplo diagnóstico diferencial composto por patologias que cursam com sintomas similares ao TDAH: envolve doenças como Epilepsias, Hipertireoidismo, Coréia de Sidehan ou Déficits Sensoriais como deficiência auditiva e visual. É importante afastá-las através de história clínica e exame físico minuciosos. Dependendo da necessidade a investigação deve ser finalizada com a realização de exames complementares.
Também é freqüente a associação do TDAH com outros distúrbios psiquiátricos como Transtorno Opositor-Desafiador, Transtorno de Conduta, Transtornos do Humor, Transtorno de Ansiedade ou com distúrbios do desenvolvimento como Transtorno de Aprendizagem Escolar e Distúrbio do Desenvolvimento da Coordenação, o diagnóstico diferencial envolve o uso de Escalas de Comportamento e a aplicação dos critérios do DSM-IV.
TDA/H – Seguimento ambulatorial: As crianças com TDAH podem apresentar dificuldades em várias funções cerebrais; isto gera repercussões negativas tanto em suas capacidades acadêmicas como em suas relações sociais. O sucesso do tratamento depende muito de como o médico orienta a criança, os familiares e os professores. É preciso uma compreensão do problema em sua origem, um entendimento sobre o seu curso e que estratégias podem ser usadas para amenizar os seu efeitos. Ensinar os pacientes que a origem do seu sofrimento tem uma gênese neurobiológica alivia-os da culpa e motiva-os a participarem do tratamento. Orientar pais e professores que a criança tem deficiências internas torna-os mais tolerantes e participativos.
As bases do sucesso do tratamento podem ser resumidas nos seguinte tópicos:
1. Aprender a reconhecer os sinais da doença e diferenciá-los de mau comportamento 
2. Manter comunicação clara e simples 
3. Estabelecer metas, criar e manter um “contrato comportamental”
4. Medir as conquistas de acordo com o nível de funcionamento da criança
5. Reconhecer as pequenas melhoras 
6. Evitar comparações 
7. Criar um ambiente acolhedor em casa 
8.Estabelecer limites, mas ser sensível às oscilações de humor
9.Manter a rotina de uma família normal 
10. Usar o bom humor para lidar com situações conflitantes 
11. Apoiar o regime medicamentoso
* Adaptado da obra Esquizofrenia e a Família – Anderson C. y Col.
Os medicamentos psicoestimulantes devem fazer parte do plano terapêutico inicial da maioria dos escolares com TDAH, porêm, é importante evitar suas prescrições logo na primeira consulta. O médico deve lançar mão destas opções quando estiver seguro do diagnóstico e evitar um equívoco freqüentemente cometido que é o de usar a resposta positiva ao medicamento como instrumento diagnóstico; também é importante que haja resolução de possíveis conflitos entre familiares ou professores bem como descartar problemas médicos que impeça o seu uso. É prudente interrompê-los quando os sintomas não melhoram de forma siguinificativa ou quando houver efeitos colaterais importantes.
Relatos científicos, não confirmados até o momento, citam um possível comprometimento do desenvolvimento pondero estatural em crianças que fazem uso de psicoestimulantes; isto não os contra-indicam, porém, é importante que se realize monitorizações semestrais de peso e estatura e os evite nos feriados e períodos de férias. Periodicamente devem-se fazer reavaliações sobre o benefício da sua continuidade; uma boa medida é deixar a criança sem medicamento nos primeiros dias de aula e observar se esta falta prejudica sua performance.
As principais causas de falha terapêutica aos psicoestimulantes são diagnóstico incorreto de TDAH, comorbidades não investigadas, doses inadequadas, horários inadequados e efeitos colaterais não suportáveis.
Consultas médicas periódicas são importantes para orientações aos familiares além de propiciarem um útil intercâmbio de informações entre a escola e os profissionais. É fundamental que o médico esteja atento a novidades científicas; afinal, com a democratização da Internet informações verdadeiras e falsas têm circulado livremente e os familiares nem sempre têm o embasamento necessário para diferenciá-las.

3. Deficiência Mental (DM)
A deficiência mental não é uma patologia específica, é um conjunto de sintomas e déficits de funções cerebrais que podem apresentar-se isoladamente ou associar-se a diferentes tipos de patologias.
O quadro caracteriza-se por uma inadequação intelectual – idade maturativa inferior a cronológica – originária no período de formação e desenvolvimento cerebral, que dificulta a inserção acadêmica e sócio-familar do indivíduo. As áreas mais comprometidas são aquelas que envolvem aprendizagem, comunicação, autos-cuidados e habilidades sociais. Os diversos estudos indicam que em 30 a 40% dos casos a etiologia da DM não é bem definida. Os 60% restantes relacionam-se a falta de estímulos ambiental, Embriopatias, Desnutrição Protéico-Calórica, Erros Inatos do Metabolismo, e doenças genéticas como S. do X frá gil e S. 
de Down. .
O diagnóstico é realizado através de testes quantitativos de inteligência (Wisc, Binet-Simon, Terman-Merril) que visam o estabelecimento de um Quociente Intelectual (QI) que é a relação entre a idade mental e a idade cronológica. O QI normal é de aproximadamente 100 (idade cronológica - idade maturativa) .
Inteligência Limítrofe: QI entre 70 e 100
DM Leve: QI entre 50-55 a aproximadamente 70
DM Moderado QI entre 35-40 a 50-55
DM Severo: QI entre 20-25 a 35-40
DM Profundo: QI abaixo de 20
Os casos limítrofes e DM leve constituem 85% dos casos de DM, as crianças cursam inicialmente com discreto atraso do desenvolvimento neuropsicomotor principalmente com atraso ou dificuldades de linguagem. Geralmente são diagnosticados em idades mais tardias, quando passam a freqüentar a escola, período em que surgem as dificuldades de aquisição da leitura e de sociabilização com outras crianças. Possuem capacidade de alfabetização desde que bem estimulados, são profissionalizáveis, adaptam-se aos trabalhos manuais que não requerem raciocínio ou iniciativa. Os DM moderados são treináveis, podem adquirir hábitos de higiene e eventualmente atividade profissional supervisionada. Os DM severos e profundo geralmente são de etiologia orgânica, são os que mais comumente apresentam sintomatologia neurológica e condutas atípicas (pautas autistas).

Transtorno de Aprendizagem Escolar – Algoritmo diagnóstico
1. Relatório Escolar com informações sobre o perfil acadêmico e comportamental da criança.
2. História clínica As principais características de TAE relacionado a doenças neurobiológicas são dificuldades persistentes de aquisição da leitura, principalmente após os nove anos de idade, antecedentes de a traso de aquisição ou transtornos da linguagem, sintomas relacionados à atenção, motricidade e memória, história familiar de doenças neurobiológicas como TDAH, Tourret, Autismo, Distúrbios da linguagem e Dislexia.
3. Exame físico geral
4. Exame neurológico evolutivo análise de funções como atenção, percepção, memória, coordenação, praxia, escrita (organização, ortografia) e leitura (fluência e compreensão).
5. Avaliação da acuidade auditiva e visual.
6.Testes psicométricos para avaliar potencial cognitivo (psicólogo, neuropsicólogo)
7. Avaliação lingüística (fonoaudióloga)
8. Avaliação do Processamento Auditivo (processamento encefálico da audição)
9. DSM-IV, q uestionários de comportamento, respondidos por criança, professores e familiares.
10. Exames complementares: São indicados somente quando há suspeita de patologia orgânicas específicas que possam gerar sintomas cognitivos e comportamentais. Eletroencefalograma: Epilepsias que cursam com crises convulsivas sutis como Ausência, Parcial simples e complexa, crises durante o sono. Níveis séricos de hormônios tireoidianos: disfunção de tireóide. Erros inatos do metabolismo e Estudos cito-genéticos para síndromes específicas. Exames de Neuroimagem: distúrbios da linguagem e alterações motoras focais.

Conclusões
O melhor procedimento diagnóstico e terapêutico a ser adotado diante de uma criança com TAE é encaminhá-la para uma avaliação multidisciplinar procurando analisar todas as circunstâncias sociais, familiares e individuais que a rodeiam.
É fundamental a compreensão que a patologia decorre de déficits de funções cerebrais básicas e que tais déficits repercutem-se sobre o comportamento e rendimento escolar da criança. Tanto as estratégias educativas como as medicamentosas devem ter o objetivo de amenizar os efeitos destes déficits.
Os profissionais que se dedicam a esta área devem dispor de tempo, paciência, conhecimento técnico, espírito de equipe e principalmente um sentido fraterno para compreender as angústias destes pacientes e seus familiares para assim orientá-los adequadamente.

Referência Bibliográfica
  1. Diament A., Cypel S., Neurologia Infantil 2ª edição – L. Atheneu Editora, 1990.
  2. Ratey. J.J. O Cérebro – Um guia para o usuário – Editora Objetiva, 2002.
  3. Guyton Arthur C. Tratado de Fisiologia Médica.Editora Interamericana Ltda 1997.
  4. Galaburda M.A. From Reading to Neurons MIT Press January 1989
  5. Galaburda M. A. The Languages of the Brain MIT Press Decembers 2002
  6. 6. Cypel S. A criança com Déficit de Atenção e Hiperatividade:, São Paulo: Lemos Editorial, 2000
  7. 7. Pascual-Castroviejo I. TDAH Guia Prático Diagnóstico e Terapêutico: Madrid, Espanha: César Viguera Editora, 2002.
  8. Clínicas Pediátricas da América do Norte – TDAH: Andrew M. Morgan, MD: Madrid, Espanha:Ed.Harcourt, AS, 1999.
  9. Sell-Salazar F. TDAH – Rev Neurol 2003: 37 (4): 353-58
  10. Bará-Jimenez S. – Perfil neuropsicológico e condutual de crianças com TDAH – Rev. Neurol 2003: 37 (7): 608-615
  11. Barkley Russell A. - Uso de estimulantes e abuso de drogas em TDAH - Pediatrics Janeiro 2003 vol 11 nº 1 Pg. 97-109
Fonte: http://www.neuropediatria.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=94:por-que-a-crianca-nao-aprende-na-escola&catid=59:transtorno-de-aprendizagem-escolar&Itemid=147
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A Dislexia de forma anatômica


Conforme Crossman, no Córtex Cerebral podem ser distinguidas diversas áreas, com limites e funções relativamente definidos. A diferença entre elas reside na espessura e composição das camadas celulares e na quantidade de fibras nervosas que chegam ou partem de cada um.
O Córtex Cerebral possui divisões e, dentro desta, localiza-se o lobo parietal que é o responsável pela função da percepção, memória e análise visual. Ocorrendo uma disfunção neste lobo haverá o que chamamos de dislexia.
O Lobo Parietal – (localizado a partir do sulco central para trás). O lóbulo parietal superior é responsável pela interpretação da informação sensorial geral e pelo conhecimento consciente da metade contralateral do corpo. Nesse local, as lesões comprometem a interpretação e a compreensão das entradas sensoriais, e podem causar o abandono da outra metade do corpo. O lóbulo parietal inferior forma a interface entre o córtex sômato-sensorial e os córtices de associação visual e auditiva, respectivamente, dos lobos occipital e temporal, e, no hemisfério dominante, contribui para as funções da linguagem.
A lesão do corpo parietal esquerdo causa:
  • Crises parciais: ataques paroxísticos de sensações anormais, propagadas pelo lado contralateral do corpo (crises sensoriais).
  • Deficiências sensório-motoras: perda hemissensorial contralateral e perda do campo visual inferior.
  • Deficiências psicológicas: incapacidade de dar nome aos objetos e perda da capacidade de ler (alexia), escrever (agrafia) e calcular (acalculia).
A lesão do lobo parietal direito causa:
  • Crises parciais: ataques paroxísticos de perturbações sensoriais afetam o lado contralateral do corpo (crises sensoriais simples).
  • Deficiência sensório – motora: perda hemissensorial contralateral do campo visual inferior.
  • Deficiências psicológicas: incapacidade de copiar e de construir esquemas devido à desorientação espacial (apraxia de construção).


Sinais que aponta para a Dislexia

1 Antes da alfabetização – mais ou menos aos 03 e 04 anos:
  • Atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem.
  • Dificuldade de decorar versos, aprender canções e contar histórias, fazer rimas e narrar histórias.
  • Problemas na motricidade fina (recortes com tesoura, desenhos) e na grossa (caminha de forma desengonçada, tropeça com facilidade).
  • Falta de interesse em livros. Só se interessa por aqueles que tenham muitas figuras.
  • Dificuldade com quebra-cabeças.
  • Confunde conceito de ontem/hoje/amanhã (orientação temporal).
  • Sabe separar fichas por cores, mas não decoram o nome da cor.
  • Incidência maior em canhotos e ambidestros.
    • Sinais da idade escolar
  • Ocorrem trocas ortográficas, mas dependem do tipo de dislexia (em 80% dos casos, a letra do disléxico será é feia ou com incidência de inversão, como “b” virado).
  • Problemas para reconhecer rimas e fonemas repetidos.
  • Desatenção e dispersão.
  • Desempenho escolar abaixo da média em matérias específicas que dependem da linguagem escrita.
  • Dificuldade de coordenação motora fina (para escrever, desenhar e pintar) e grossa (descoordenação).
  • Dificuldade de copiar as lições do quadro ou de um livro.
  • Confusão entre esquerda e direita, observáveis na ginástica e no trabalho com mapas.
  • Dificuldade de expressão: vocabulário pobre, frases curtas, estrutura simples e sentenças vagas.
  • Esquecimento de palavras.
  • Problemas de conduta.
  • Desinteresse ou negação da necessidade de ler.
  • Leitura demorada, silabada. Esquecimento de tudo o que lê.
  • Desnível entre o que ouve e o que lê (aproveita o que ouve, mas não o que lê).

Além disso, os indivíduos disléxicos podem apresentar:
  • Família com histórico de dislexia ou dificuldades de aprendizagem.
  • Dificuldades em ler relógio analógico e saber seqüência dos meses.
  • Dificuldades na aprendizagem de língua estrangeira.
  • Podem manifestar problemas emocionais relacionados a auto-estima, frustração, ansiedade e até mesmo atitudes agressivas.
  • Dificuldade de retenção de texto (precisam ler mais de uma vez para entender).
Nem todos os disléxicos desenvolvem os mesmos dons, mas eles certamente possuem algumas funções mentais em comum.

Seguem as habilidades básicas de que todos os disléxicos compartilham:
  • São capazes de utilizar seu dom mental para alterar ou criar percepções (a habilidade primária).
  • São altamente conscientes do meio ambiente.
  • São mais curiosos que a média.
  • Pensam principalmente em imagens em vez de palavras.
  • São intuitivos e capazes de muitos insights.
  • Pensam e percebem de forma multidimensional (utilizando todos os sentidos).
  • Podem vivenciar o pensamento como realidade.
  • São capazes de criar imagens muito vívidas.
Estas oito habilidades básicas se não forem suprimidas, anuladas ou destruídas pelos pais ou pelo processo educacional resultarão em duas características: inteligência acima do normal e extraordinária criatividade. A partir daí, o verdadeiro dom da dislexia gera o dom da mestria. Este dom se desenvolve de muitas maneiras e em muitas áreas. Para Albert Einstein, foi na física; para Walt Disney, nas artes; para Magic Johnson, no esporte.
Ou seja, é um transtorno severo e persistente da aprendizagem da leitura e escrita em indivíduos com condições intelectuais normais e freqüência escolar adequada. Mais especificamente, a dislexia é um transtorno específico nas operações envolvidas no reconhecimento das palavras e compromete, em maior ou menor grau, a compreensão da leitura. 
A dificuldade é de um grau clinicamente significativo, medido por testes padronizados, apropriados à cultura e ao sistema educacional. Os disléxicos estão atrasados, na leitura e na escrita no mínimo dois anos com relação aos seus colegas. Existe uma moderada evidência de origem genética, o que requer um tratamento e que envolve um processo laborioso, sujeito a recaídas e, fundamentalmente, associado à família e à escola, demandando também uma equipe multidisciplinar para seu diagnóstico e tratamento, sendo que, a equipe, deve ser composta por neurologistas, psicólogos, psicopedagogo e fonoaudiólogo.

Fonte - grupopsicopedagogiando.blogspot.com
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Cérebro e Leitura


Cérebro e leitura: Matéria muito interessante sobre a região do cérebro que ativa quando a leitura é realizada! 





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Síndrome de Susac - Caso clínico


CASO CLÍNICO

A paciente procurou o consultório em outubro de 1995, quando tinha 34 anos de idade, com história de ter apresentado há cerca de 10 anos episódio de distúrbio de comportamento associado a perda do controle esfincteriano e hipoacusia. Esta última continuou a progredir até cerca de 1 ano após a primeira crise. Na época foi tratada por psiquiatra com medicação cujo nome não se recorda, tendo apresentado melhora em 30 dias, restando porém dificuldade de marcha e hipoacusia. Queixava-se de piora da visão na primeira consulta, mas o quadro motor permanecia estável.
Devido à hipoacusia, havia procurado anteriormente vários otorrinolaringologistas, tendo sido submetida a diversas cirurgias com colocação de prótese auditiva bilateral, sem apresentar, entretanto, qualquer melhora do déficit auditivo. A paciente trouxe alguns exames que já haviam sido solicitados durante a investigação prévia: angiografia com fluoresceína mostrando neurite isquêmica (interrogada), ressonância magnética (RM) de crânio com pequenos focos de hiperintensidade periventriculares e líquor normal. Os achados do exame neurológico incluíam voz escandida, marcha discretamente atáxica, hiperreflexia bilateral assimétrica (mais intensa à esquerda), com reflexos cutâneo-plantares em flexão, discreta dismetria na prova dedo-nariz à esquerda e diminuição da acuidade auditiva e visual com palidez de papilas. A avaliação dos campos visuais mostrava comprometimento dos campos inferiores.

Os exames laboratoriais adicionais solicitados (hemograma, bioquímica, hepatograma, provas de atividade reumática, fator anti-nuclear - FAN, dosagem de anticorpos anti-DNA e eletroforese de proteínas) foram normais, assim como os potenciais evocados visuais e somato-sensitivos. O mesmo não ocorreu com o potencial evocado auditivo, que foi de baixíssima amplitude.
Durante todo o tempo de acompanhamento (última consulta em 1999), manteve-se clinicamente estável, sendo tratada com pentoxifilina, hidroxizine, ácido acetil-salicílico e sintomáticos (dimenidrato e flunarizina para episódios de vertigem). Realizou diversos exames de RM, audiometria e campimetria sem alterações em relação aos exames iniciais (Figs 1-3). A paciente, entretanto, permanece com sequelas: alterações do campo visual e hipoacusia bilateral, além de queixa de déficit de memória.




DISCUSSÃO
A síndrome de Susac caracteriza-se pela presença de uma tríade (que pode aparecer de forma completa ou incompleta em cada paciente) composta de encefalopatia, hipoacusia neurossensorial e alterações visuais5,6. Ao exame histopatológico são observados microinfartos restritos à cóclea, pequenas arteríolas da retina e cérebro, causados por vasculopatia não-inflamatória. A sua fisiopatologia é controversa. Os estudos histopatológicos sugerem relação com a ocorrência de pequenos infartos devido a oclusões arteriolares, de mecanismo ainda desconhecido. Não foram identificadas necrose fibrinóide ou vasculite e nenhum dos pacientes descritos na literatura preencheu os critérios clínicos ou sorológicos para o diagnóstico de qualquer doença do tecido conectivo. Não foram igualmente identificadas alterações de coagulação que pudessem sugerir um estado de hipercoagulabilidade, ou evidências de microembolismo. Da mesma forma a hipótese de afecção imunomediada deflagrada por infecções virais não foi confirmada. Além disso, a resolução completa das manifestações neurorradiológicas, descritas em alguns casos, seria incomum no infarto cerebral, implicando a ocorrência de isquemia ou inflamação perivascular na patogênese.4
Sugeriu-se que o acometimento tecidual altamente seletivo verificado nesta síndrome esteja relacionado à origem embriologicamente comum do cérebro, retina e cóclea. Tanto a retina como o ouvido interno apresentam barreiras análogas à barreira hemato-encefálica, cujo endotélio pode apresentar propriedades estruturais, funcionais e antigênicas comuns2,9,10.
Em cerca de 40% dos casos pode-se encontrar cefaléia associada ou não a aura visual como sintoma prodrômico. A síndrome cerebral orgânica tem início rápido com disfunção cognitiva em cerca de 75% dos pacientes, caracterizada principalmente por disfunção da memória recente e apatia ou desorientação flutuante, além de comportamento bizarro ou paranóide, alucinações ou bulimia2. Ao exame físico, podemos encontrar hiperreflexia, com sinal de Babinski bilateral, marcha instável, disartria, dismetria, paralisias de nervos cranianos (principalmente III, VI e VII nervos), hemidisestesia, hemiparesia, mioclonias e incontinência urinária. O primeiro ataque pode ser precedido de alteração mental ou de personalidade lentamente progressivas (em algumas semanas). A RM pode mostrar lesões multifocais hiperintensas em T2 interessando a substância branca e cinzenta supra e infratentorial, com captação durante as crises2.
Em pacientes submetidos à arteriografia cerebral, esta foi normal em 20 dos 22 casos descritos4. Ao eletrencefalograma podem ser vistas ondas lentas difusas ou pontas e ondas2,6. O líquor apresenta aumento discreto de proteínas em grande parte dos casos, com pleocitose linfocitária discreta em 50%2,4.
A retinopatia é caracterizada pela presença de oclusões múltiplas bilaterais de ramos das artérias retinianas, podendo haver prejuízo da visão se localizadas no pólo posterior. Por outro lado, as oclusões restritas á porção periférica da retina podem ser assintomáticas (neste caso, a fundoscopia pode ser normal). Não são encontradas células no vítreo ou câmara anterior (ou seja, não há uveíte associada), proliferação neovascular, sangramento intravítreo, descolamento espontâneo da retina ou acometimento venoso2,4,6. O aspecto à angiografia com fluoresceína é indistinguível de vasculite retiniana. Há estreitamento arterial e extravasamento de contraste na fase tardia do exame, mas a hemorragia retiniana é menos frequente4.
A hipoacusia é de natureza neurossensorial e de instalação aguda, bilateral e assimétrica, podendo ser o sintoma inicial e estar associada a vertigem, instabilidade da marcha, zumbido, náusea, vômitos e nistagmo proeminente, ou por outro lado, ser assintomática e só diagnosticada após a realização de audiograma. Este mostra comprometimento principalmente das freqüências mais baixas. Há diminuição da resposta vestibular a estímulos calóricos2,4.
Quanto aos exames laboratoriais, não são encontradas alterações na velocidade de hemossedimentação, proteínas de fase aguda, marcadores autoimunes ou coagulograma, e não há evidências de associação com agentes infecciosos2.
A evolução habitual se caracteriza por ataques recorrentes, em número de 1 a 8, envolvendo um ou mais componentes da tríade. Os ataques são autolimitados, e entram em remissão após uma fase aguda que dura em média 18 meses. Um terço dos pacientes permanece com déficit cognitivo residual (demência leve a moderada) e distúrbios de marcha. Todos os pacientes descritos até o presente momento ficaram com algum déficit visual e auditivo. Nenhum óbito foi atribuído a esta síndrome. As alterações neurorradiológicas podem desaparecer após a fase aguda; o líquor e a fundoscopia podem se normalizar espontaneamente em algumas semanas2.
O diagnóstico diferencial é extenso e inclui esclerose múltipla, vasculites sistêmicas primárias (como doença de Behçet, granulomatose de Wegener, síndrome de Churg-Strauss, poliarterite nodosa e arterite de Takayasu, entre outros), vasculites secundárias (lúpus eritematoso sistêmico, sarcoidose, síndrome de Sjögren, crioglobulinemia), vasculites relacionadas a quadros infecciosos (sífilis, doença de Lyme, tuberculose, herpes zoster, toxoplasmose, etc.), arteriosclerose, quadros embólicos, doenças trombofílicas, uso de drogas como cocaína, metanfetaminas, ergotismo e doenças mitocondriais4.
Fatores que devem motivar investigação diagnóstica específica incluem quadros suspeitos de vasculite de retina7, hipoacusia neurossensorial em pacientes avaliados para esclerose múltipla, pacientes com audiograma revelando surdez neurossensorial bilateral predominando em baixas frequências e RM mostrando múltiplas hiperintensidades em T2 envolvendo substância branca e cinzenta, além de qualquer encefalopatia inexplicada em pacientes jovens2. É importante manter um alto grau de suspeição, já que a tríade descrita pode ocorrer de forma incompleta em muitos pacientes e a presença de déficit visual ou auditivo pode não ser identificada adequadamente em pacientes com encefalopatia. Os exames que devem ser solicitados para confirmação diagnóstica incluem campimetria, angiografia com fluoresceína, audiograma e RM de crânio, sendo que estes devem ser repetidos periodicamente nos primeiros anos da doença de forma a identificar piora do quadro, mesmo que assintomática2.
O tratamento da síndrome de Susac é controverso7, devido ao seu curso flutuante, progressivo e auto-limitado. Papo et al., em sua revisão de 1998 2, sugeriram o uso de antiplaquetários e/ou anticoagulantes associados à nimodipina como tratamento de primeira escolha (seguindo a hipótese tromboembólica e visando a melhora da irrigação microvascular). Corticóides em altas doses podem constituir a segunda opção de tratamento, seguidos de ciclofosfamida ou imunoglobulina intravenosas. A duração do tratamento, bem como o melhor esquema terapêutico, são incertos, devido ao desconhecimento quanto à provável fisiopatologia desta síndrome.
Concluindo, descrevemos aqui o que acreditamos ser o primeiro caso de síndrome de Susac da literatura brasileira. Enfatizamos a importância da investigação diagnóstica e do alto grau de suspeição necessários para sua identificação, que pode estar sendo subdiagnosticada em nosso meio, e reforçamos a noção da natureza benigna desta entidade.

REFERÊNCIAS
1. Susac JO, Hardimann JM, Selhorst JB. Microangiopathy of the brain and retina. Neurology 1979;29:313-316.         [ Links ]
2. Papo T, Biousse V, Lehoang P, et al. Susac syndrome. Medicine 1998;77:3-11.         [ Links ]
3. Mala L, Bazard MC, Berrod JP, et al. Petits infarctus rétiniens, cochléaires et cérébraux du sujet jeune, ou "SICRET" syndrome ou syndrome de Susac. J Fr Ophtalmol 1998;21:375-380.         [ Links ]
4. Petty GW, Engel AG, Younge BR, et al. Retinocochleocerebral vasculopathy. Medicine 1998;77:12-40.         [ Links ]
5. Susac JO. Susac´s syndrome: the triad of microangiopathy of the brain and retina with hearing loss in young women. Neurology 1994;44:591-593.         [ Links ]
6. O'Halloran HS, Pearson PA, Lee WB, Susac JO, Berger JR. Microangiopathy of the brain, retina and cochlea (Susac syndrome): a report of five cases and a review of the literature. Ophthalmology 1998;105:1038-1044.         [ Links ]
7. Gass A, Graham E, Moseley IF, Stanford M, MacDonald WI, Miller DH. Cranial MRI in idiopathic retinal vasculitis. J Neurol 1995;242:174-177.         [ Links ]
8. Wildermann B, Schülin C, Storch-Hagenlocher B, et al. Susac´s syndrome: improvement with combined antiplatelet and calcium antagonist therapy. Stroke 1996;27:149-150.         [ Links ]
9. Monteiro MLR, Swanson RA, Coppeto JR, Cuneo RA, Dearmond SJ, Prusiner SB. A microangiopathic syndrome of encephalopathy, hearing loss and retinal arteriolar occlusions. Neurology 1985;35:1113-1121.         [ Links ]
10. Schlossauer B. The blood-brain barrier: morphology, molecules and neurothelin. Bioessays 1993;15:341-346.         [ Links ]


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